Policiais usam twitter para denunciar corrupção dentro da PM no RJ




Entrevista - 06/01/2010 10:30 
Boca de Sabão
Por Talitha Ferraz




No dia 3 de janeiro, o jornal O Dia noticiou a polêmica em torno do perfil Boca de Sabão, criado há nove meses na rede social Twitter, na internet. A página é atualizada por quatro policiais militares do Rio de Janeiro e possui, atualmente, cerca de 1.800 seguidores. Segundo a reportagem, com a ajuda de mais dez colegas da corporação, os policiais criaram o Boca de Sabão com o objetivo de denunciar anonimamente casos de corrupção e agruras trabalhistas dentro da PM do Rio de Janeiro. 


O Boca de Sabão parece confirmar o papel que hoje as redes sociais da internet desempenham na criação de espaços virtuais, onde falsos perfis, os chamados “fakes”, passam a dar visibilidade a desmandos de instituições e representantes de órgãos público. Sobre a função das redes de relacionamento como instrumentos de ação política, vigilância e anonimato, o Notícias e Análises conversou com a pesquisadora em Cibercultura, Gabriela Zago, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Gabriela desenvolve o estudo “Jornalismo em Microblogs: o Twitter como suporte para produção e difusão de conteúdos jornalísticos” e falou acerca do perfil Boca de Sabão.


Há hoje uma nova perspectiva em relação às redes sociais como espaços destinados à denúncia de casos de corrupção e crimes em instituições públicas ou privadas? E o anonimato, como entra nessa campo?


As redes sociais na Internet ampliam os canais que podem ser utilizados para o exercício da democracia. Qualquer um com acesso à rede pode manifestar sua insatisfação com produtos ou serviços. Diferentes vozes podem ser coordenadas. Assim como acontece fora da rede, o anonimato geralmente é mal visto. Entretanto, no caso de denúncias de corrupção e casos relativos à polícia militar, não parece haver alternativa, tendo em vista a rigidez das regras que regem a polícia, o que os impossibilitaria de fazer qualquer denúncia séria e ainda assim manter seu posto. São dois princípios constitucionais a serem sopesados: a liberdade de expressão, de um lado, e a vedação ao anonimato, de outro. Usar a rede de forma anônima para denúncias internas que talvez de outro modo não teriam como ser feitas constitui uma interessante apropriação da tecnologia, e representa não um total desrespeito ao princípio da vedação do anonimato, mas sim uma mera flexibilização de tal princípio em favor da liberdade de expressão.


No caso do Boca de Sabão, as twittadas repercutiram para além da internet. Como instrumentos como micro-blogs geralmente comportam a função de construção de uma "ética" ou a função de agente de "ação social"?


Os policiais, ao que me parece, não fazem as denúncias anônimas apenas porque querem fugir da punição, o fazem dessa forma porque na situação não há outra possível. Ou eles ignoram o que acontece a sua volta, ou buscam alternativas para divulgar para todos os problemas que o comando enfrenta, as situações de corrupção. Nesse contexto, o twitter e outras ferramentas de redes sociais podem ser vistas como instrumentos de ação coletiva, como ferramentas não para substituir, mas para complementar os demais canais já existentes para denúncias. Não dá para simplesmente ignorar o que é dito em sites de redes sociais, caracterizar como uma informação menor, por não estar confirmada. As pessoas estão lá, manifestando suas opiniões diretamente - porque querem, porque podem - e isso não deveria ser ignorado pelo poder público ou por empresas.


Vemos que a vigilância em ações policiais vêm se tornando, pelo menos no Rio de Janeiro, algo cada vez mais comum, seja por via das câmeras que hoje se espalham em comunidades após as pacificações, seja por planos de equipar viaturas da polícia com escutas e câmeras. Como as redes sociais na internet entram nessa questão de vigilância que já existe fora da web? Um twitter como o Boca de Sabão pode ser considerado um mecanismo de vigilância apenas por denunciar?


As redes sociais são apenas mais um mecanismo de vigilância, talvez com o diferencial de serem mecanismos de baixo para cima, diferentemente dos demais instrumentos utilizados pela polícia para vigilância, operados de cima para baixo. Como nas redes sociais o controle geralmente não está nos altos escalões das organizações, pode-se ter uma maior liberdade para exercer o direito de crítica. A vigilância estaria não no fato de a informação ser publicada no perfil, mas no próprio fato de policiais e cidadãos estarem atentos ao que está ao seu redor, utilizando o perfil para enviar o que observam.

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